BEM ME QUER MAL
(A TODAS AS MULHERES VITIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA)
Poisei os olhos no amor e na felicidade
quando o bater do coração me pareceu
que alongava a vida.
Apareceste... que medo.
Medo de sentir a implacável garra do
amor,
transformar a solidão em algemas de
ilusões.
Medo que as estrelas que sempre vi ao
longe
caiam com leveza sobre a minha cabeça.
Medo que o corpo levite
até onde a sombra dos sentidos
adormecem.
Medo que brotem fervores ao chegar da
tempestade
e a aceitação do prazer faça cantar
os olhos.
Medo de acreditar que já não sou
desabitada
e em mim more outrem e se funda.
Um medo que o vento não leva,
o tempo não esquece porque o sempre é
hoje
e indivisíveis somos intemporais.
O amor veio...
A felicidade adquiriu a forma
de palavras concebidas sem pecado,
construindo ermidas de sonhos onde o
medo se perdeu.
Amar a dois corpos virados a sul por
onde entra o sol
sem queimar o macio da esperança
prolongou o mistério dos murmúrios
e do êxtase que atingimos ao soltar
das nuvens.
As noites de suor tornaram-se leves,
povoadas de casulos a darem à luz
desejos de seda.
Soube de amor e sexo e do abrir o
universo em mim.
Soube, não sei mais...
O fechar dos punhos que rompeu a
harmonia
está debaixo da tua pele e faz sangrar
o que hoje é a realidade:
A discórdia de um destino a que não
me resignei.
Voltou o medo, outro medo...
A sonhada felicidade arde-me por
dentro.
A dureza do tempo enganoso e implacável
acende a noite mais adiante,
para além de uma cama, para além das
promessas.
O acreditar no “para sempre” está
cheio de nós e de atitudes de barro.
O amor emperrou, o amanhã não será
alheio à violência,
O chão não será o meu caminho
nem as algemas voarão sobre a
desilusão.
Tornei-me na barricada que sustém o
sangue e as lágrimas,
que escorrem nas mãos da mentira e do
engano.
O feminino levado ao tapete pela
fragilidade que povoa os esfarrapados de mente
não morreu.
Enfeita o que resta quando se parte
para o obscuro,
segue o rasto dos passos que ainda
deixam marca de renovação,
procura novos acessos para sair da
encruzilhada,
ensina à solidão que da vida não se
tem piedade.
Mais medo...
O medo de reencontrar algures a
indefinição do que é estar inteira.
O medo de pôr termo à submissão
Mas o medo tem término...
E num gritar de boca já sem medo,
acreditar que há outros dias para
renascer.
Viver sem ele é gostar da condição
do ser mulher ,
decepá-lo e ir até onde principia a
zanga a que se tem direito
para que se possa margear livremente o
amor.
JFV
03/03/2015
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