quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Quero tanto ser importante...




 Otto Dix

(-Quero tanto ser importante-)

Andar com dois mestrados pela trela.
Falar mandarim enquanto mastigo pizza prateada
e italiano com chau min de ouro na boca.
Representar Beckett, Tennessee Williams, Juan Mayorga
numa cama de corcel
onde possa esperar que Godot chame o desejo
sem parecer um animal noturno com cio.
Ler a Bíblia, Vedas, Alcorão, Tanakh e outros mais
para quando o pecado urgir
a absolvição seja instantânea
e não entre no céu por orifícios adversos.
Vestir etiquetas de marca e não me constipar.
Morar em Peak Road, Fifth Avenue, Knightsbridge
sem me sentir o indigente sobre quem caiu o tecto de Deus.
Aprender a colocar vírgulas e reticências no final das ruas
e usar a semântica como passadeiras para peões.

(Não pretendo chocar com a inteligência
nem ser atropelado por ideias ou raciocínios).

Descer aos confins do inferno
e assar a raiz do pensamento nas labaredas de Dante
de forma que as punições sejam uma “Divina Comédia”.
Cumprimentar o trolha, o camponês, o feirante.
Passar pelos seus pardieiros sem solidão nas janelas.
Os filhos a crescerem à minha passagem
põem-me um açaime para não morder as próprias canelas.

(A importância que tenho foi arrancada do chão
pelo acariciar dos vendavais que a vida persegue)


JFV

10/02/2016